Combatentes pró-democracia apoiam rebeldes étnicos birmaneses
Ao cair da noite, combatentes de um grupo rebelde étnico patrulham a linha de frente no norte de Mianmar, buscando a sombra do inimigo no horizonte, em seu conflito de longa data com os militares, agravado desde o golpe de 2021.
O chamado Exército de Libertação Nacional de Ta'ang (ELNT) é um dos vários grupos rebeldes étnicos nas zonas fronteiriças de Mianmar que lutaram contra os militares por mais autonomia e controle sobre seus recursos.
Durante décadas, sua luta pela autonomia e as denúncias de abusos maciços dos direitos humanos por parte das Forças Armadas passaram despercebidas pela maioria étnica bamar de Mianmar.
Mas, após o golpe militar de fevereiro de 2021 e a brutal repressão contra a dissidência, grupos como o ELNT se tornaram cruciais na luta de Mianmar pela democracia, ao abrigar e treinar as recém-formadas "Forças de Defesa Populares" (FDP), dominadas pelos bamar, que lutam contra a junta.
"Encontramos solidariedade, compreensão e apoio de outras localidades de Mianmar depois do golpe", disse o brigadeiro-general Tar Bhon Kyaw, do território do grupo no estado de Shan, ao norte.
"As pessoas agora entendem pelo que estamos lutando (...) Isso é um benefício do golpe", completou.
Após o golpe, o ELNT – que diz lutar pela autonomia da etnia ta'ang – suspendeu uma trégua com os militares e, desde então, tem travado confrontos regulares com as tropas da junta.
Agora, diz ter mais de 7.000 combatentes em seu território no estado de Shan, por onde passa a estrada para a China.
- 'Outra forma de lutar' -
Em um acampamento escondido, os novatos percorreram um campo de obstáculos e atravessaram um rio em fila única com seus fuzis AK47s e M-22s em mãos, na escuta de um inimigo imaginário.
Mai Naing Aung Kyar, 24, ingressou no ELNT após o golpe para enfrentar a junta.
“Não podemos protestar nas cidades, mas pensei que entrar para o ELNT seria outra forma de lutar”, disse à AFP durante uma pausa no treinamento.
Além de jovens ta'ang, o ELNT deu "treinamento militar" a membros do FDP de fora de seu território, afirmou Tar Bhon Kyaw, e ajudou-os a adquirir armas.
Analistas disseram que grupos rebeldes étnicos na fronteira com China, Tailândia e Índia treinaram e armaram milhares de combatentes do FDP, um força que surpreendeu os militares com sua eficácia e arrastou os militares para um sangrento atoleiro, avaliam analistas.
Em fevereiro, a junta admitiu não ter "controle total" de mais de um terço das cidades do país.
- Abrigos escolares -
Há, no entanto, grandes riscos em reiniciar o conflito com os militares e treinar seus novos inimigos, chamados de "terroristas" pela junta.
Em um povoado no território do ELNT, o chefe local Aik Oo mostrou à AFP onde ficava uma escola até que as tropas da junta incendiaram a instituição, durante um ataque.
Trabalhadores estão construindo uma nova escola e cavam buracos em um banco de argila, como abrigos improvisados ante possíveis ataques dos aviões de fabricação russa e chinesa usados pela junta.
Os militares recorreram a ataques aéreos devastadores contra seus rivais, considerados como possíveis crimes de guerra por grupos de direitos humanos.
Há algumas semanas, um bombardeio contra um vilarejo em uma zona de resistência deixou mais de 170 mortos, incluindo crianças, relatam moradores e matérias da imprensa local.
P. O'Kelly--BTZ